7 de julho de 2011
BETTY LAUER:
Meu nome original era Berta Weissberger, mas era chamada de Bertel. Quando fui [expulsa] para a Polônia, passaram a me chamar de Betus, e quando me tornei cristã [para escapar à perseguição], meu nome passou a ser Krystyna Zolkos. Depois, quando vim para cá [EUA], eu não queria ser Berta, e nem era mais Krystia, então tornei-me Betty.
ALEISA FISHMAN:
Cada mudança de nome marca um novo momento de adaptação na vida de Betty Lauer: de uma jovem judia alemã na década de 1930, a uma mulher artificialmente loira que dissimulava sua identidade judaica na Polônia durante a perseguição nazista, até ser uma imigrante nos EUA onde reuniu-se com seu pai depois da Guerra. Por meio dessas experiências, Lauer foi capaz de adquirir uma perspectiva única sobre as etapas do processo de desumanização que alimentaram o anti-semitismo nazista.
Bem-vindo a Vozes Sobre o Anti-semitismo, uma série de podcasts do Museu Estadunidense Memorial do Holocausto que foi possível graças ao generoso apoio da “Oliver and Elizabeth Stanton Foundation”. Meu nome é Aleisa Fishman. Todos os mêses, convidamos um participante para refletir sobre as diversas maneiras como o anti-semitismo e o ódio afetam o mundo nos dias de hoje. Falando de sua casa em Vermont, apresentamos Betty Lauer.
BETTY LAUER:
Nasci na Alemanha em 1926 e lá vivi até os 12 anos de idade. Claro que já existia perseguição naquele período. Naquela época em particular, tudo o que eles [nazistas] queriam era que nós judeus fôssemos embora da Alemanha, mas o problema era que ninguém queria nos receber. Os Estados Unidos não queriam uma grande quantidade de imigrantes judeus em seu país, e o governo britânico não deixava os judeus se estabelecerem na area por eles controlada no Oriente Médio, o Mandato Britânico [OBS: que incluía a região do antigo reino de Israel à qual os romanos haviam o nome de Palestina após destruir o Templo e expulsar os judeus do local]. Mas meu pai deu um jeito de sair de lá. Foi complicado, mas ele conseguiu sair e ir para os EUA, e de lá nos enviou os documentos para imigração, para que nós saíssemos também, mas naquele meio tempo, os nazistas haviam estabelecido um Aktion [i.e. Programa] através do qual expulsavam os judeus da Alemanha para a Polônia. Eles me levaram em um grupo, em um caminhão. No meio do caminho havia um pequeno riacho. Eles então jogaram tábuas sobre o riacho, como se fossem pontes, e disseram: "Quando vocês cruzarem o riacho, estarão na Polônia, e se qualquer um de vocês voltar sera recebido a bala". Havia, não sei ao certo o número, cerca de duzentas pessoas, as quais que tiveram que caminhar sobre as tábuas. E, então, eu entrei na Polônia.
Depois da aniquilação dos guetos, os nazistas estavam literalmente caçando os judeus, porque era seu objetivo não deixar nenhum judeu vivo. Na Polônia comecei a trabalhar em uma fábrica, mas me sentia constantemente observada pelos colegas. Passei a ir à igreja [católica] com meus colegas de trabalho, e eles ficavam me olhando para ver se eu iria primeiro ao confissionário ou receberia a comunhão antes [OBS: no catolicismo romano a confissão precede a comunhão]. Havia outra mulher que frequentava aquele templo, e as pessoas estavam constantemente fazendo observações de que achavam que ela era uma ''outra'' [i.e. judia]. Então, elas decidiram seguí-la e, caso encontrassem o lugar onde ela vivia, iriam fazer um registro na Gestapo [OBS: polícia secreta nazista], e algum nazista iria buscá-la [para ser enviada para a morte]. Elas me forçaram a ir com elas, e eu fui. Quando pegamos o segundo bonde [OBS: transporte urbano sobre trilhos], eu disse: "Isto é errado. Se os alemães querem encontrar judeus, deixem que eles mesmo façam isto. Nós, como cristãos, não devíamos participar de coisas assim". Então elas desistiram. Eu acho, gostaria que fosse verdade, que tenha salvo sua vida, mas jamais a vi novamente. De qualquer forma, logo depois, talvez dois dias depois, a supervisora me chamou dizendo que havia rumores de que eu era judia. E eu disse: "Não, não estou sabendo de nada disto. Por quê?" E ela respondeu: "Você sabe, não podemos correr nenhum riscos, e os rumores estão correndo. [Responda-me] Você é judia?" Eu disse que não, mas ela falou: "Eu acredito em você. Mas, por favor, não venha mais trabalhar aqui". Em outras palavras, ela não acreditou em mim mas ela não quís colocar nenhuma de nós duas em risco.
Esta coisa de identidade, isso não me incomoda. Eu sabia exatamente quem eu era, mas tive que manter isso profundamente escondido e seguir um outro tipo de vida. Acho que o fato de eu haver ocasionalmente encontrado algumas pessoas dignas (mesmo que elas não pudessem me ajudar, elas não me prejudicavam) já era uma vitória que me sustentava. Mas tudo começa com a demonização [de um grupo], e a demonização é contínua, não para, e de repente o ''outro'' se torna não humano, e se torna algo que você pode simplesmente destruir em câmaras de gás. Mas a única coisa que acreditei, que acreditei de fato, foi que depois de tudo o que vivi, depois de tudo que vi, aquilo jamais aconteceria novamente. Mas [atualmente] não é o rumo que parece estar sendo seguido.
Aprenda mais lendo a autobiografia de Betty Lauer entitulada Hiding in Plain Sight (Escondida à Vista de Todos).