23 de novembro de 2006
ROBERT SATLOFF:
Houveram árabes que colaboraram com os nazistas e outros fascistas europeus, mas também existiram outros que se recusaram a colaborar. Neste ponto, os árabes não eram tão diferentes assim dos europeus. Muitos eram indiferentes ao destino dos judeus próximos a eles. Alguns colaboraram com o nazismo, e um número menor, embora muito importante, recusou-se a colaborar e ainda ajudou a salvar vários judeus.
DANIEL GREENE
Preocupado com a difusão da negação ao Holocausto no mundo árabe, o autor Robert Satloff começou a buscar evidências de que um árabe houvesse salvo um judeu durante a Shoah [nome hebraico do Holocausto]. O que Satloff descobriu foi uma história muito pouco conhecida, de relações complexas entre árabes e judeus na África do Norte durante a Segundo Guerra Mundial. Ele conta aqueles casos em seu livro, "Among the Righteous: Lost Stories from the Holocaust's Long Reach Into Arab Lands" ("Entre os Justos: Histórias Perdidas do Longo Alcance do Holocausto nos Países Árabes").
Bem vindos a Vozes Sobre o Anti-Semitismo, uma série de podcasts, disponíveis para o público através do Museu Estadunidense Memorial do Holocausto. Junte-se a nós a cada duas semanas para ouvir novas perspectivas sobre a ameaça contínua do anti-semitismo em nossos dias. Com vocês, o historiador Robert Satloff.
ROBERT SATLOFF:
É óbvio que o Holocausto é, preponderantemente, uma história europeia. Ele foi criado por europeus, cometido por europeus, e executado principalmente contra os judeus e membros de outros grupos que viviam na Europa. Mas existe um componente importante e negligenciado do Holocausto, a parte que teve local no mundo árabe. Desde o início, os alemães e seus aliados tentaram impor sua visão-de-mundo a todas as terras que a Alemanha esperava conquistar, e isto incluía uma grande extensão de solo árabe, que ia de Casablanca ao Cairo, e como revelaram evidências recentes, até a Palestina [naquela época sob o Mandato Britânico]. Felizmente, a Guerra terminou naquela parte do mundo em meados de 1943. Por isto, os nazistas não conseguiram impor totalmente sua visão, mas deram um grande passo em direção a seu objetivo através do encarceramento de milhares de judeus em campos no Marrocos, na Argélia, na Líbia e na Tunísia.
Os árabes tiveram um papel importante em todos os estágios daquele processo. Foram membros do alto escalão dos governos títeres locais, havia guardas árabes, engenheiros ferroviários árabes, tradutores árabes, árabes que batiam de porta em porta com as SS na Tunísia para identificar quais as casas eram de judeus e quais não eram. Em cada etapa, os árabes tiveram um papel. Assim, também faz sentido que tenha havido alguns árabes que fizeram o possível para ajudar e até mesmo resgatar e salvar judeus.
Minha família e eu nos mudamos para a África do Norte logo após o dia 11 de setembro de 2001, e a partir de então iniciei uma busca pelos heróis árabes do Holocausto. Quero dizer, há uma história incrível, por exemplo, sobre Algiers em 1941 ou 1942, quando todos os pregadores das mesquitas, todos os imames promulgaram um decreto probindo que os islâmicos daquela cidade custodiassem as propriedades judaicas [que haviam sido tiradas dos judeus à força], um negócio muito lucrativo nos primeiros anos da Guerra. Nem um único árabe, nem um único muçulmano, aceitou a oferta do governo de Vichy [governo francês colaborador dos nazistas] para custodiar as propriedades judaicas. Esta é uma história incrível, a qual deveríamos contar ao mundo, pois é algo de que se orgulhar, de que os árabes devem se orgulhar, e algo que os judeus devem saber porque faz parte deste mosaico.
Eu recebi mensagens de pessoas que mostraram um sentido de humanidade básica, que mostraram que mesmo quando as pessoas não arriscaram suas vidas, elas arriscaram algo bastante próximo disto. Estas pessoas nunca serão conhecidas. Estes heróis anônimos nunca serão lembrados pela história através de seus nomes. Mas acho que é importante lembrar que esta humanidade básica, de árabe para judeu, aconteceu em uma época de terríveis dificuldades, de enormes perseguições, e mesmo assim os sentimentos de fraternidade não deixaram de existir para alguns. Estas pessoas têm que ser lembradas e reconhecidas pelo heroísmo que demonstraram.
LEITURAS RECOMENDADAS:
Para maiores informações, veja o capítulo 4, entitulado “Nobody Told Them to do That” (Ninguém Disse a Eles para Fazer Isso), e o capítulo 5, de nome “The Arabs Watched Over the Jews” (Os Árabes que Protegeram Judeus), do livro “ Among the Righteous: Lost Stories from the Holocaust's Long Reach into Arab Lands” (Entre os Justos: Histórias Perdidas do Longo Alcance do Holocausto nos Países Árabes"), escrito por Robert Satloff (Copyright © 2006 por Robert Satloff. Publicado nos EUA por PublicAffairs™, membro do “Perseus Books Group”).